sexta-feira, 19 de março de 2010

das tranças, aquela.


E como se nao bastasse abriu o caderno e escreveu que era como uma dessas que procura pelo principe dessas de tranças longas e fitas descoloridas e desgastadas pelo tempo, que olha longe e sente frio, toma sopa uma vez ou outra e que anda de chinelos - com meias! sem se importar com qualquer outro gemido vindo de fora senão de sapos e cavalos. Anteontem acordou assustada, correu até a cozinha e se serviu de meio litro d’agua, estava afoita e teimava em encontrar alguem para contar que viu no sonho o tal principe, alguem que fechasse os olhos por um segundo só pra ver o sonho dela, só pra ver também o seu reflexo nos olhos do principe, mas a cozinheira - a gorda - já havia se deitado e nem o cocheiro que vivia de bebericos escondidos na cozinha estava ali hoje para ser o ouvido fiel e desejoso da menina, aquela. E assim com uma pureza só possível em certas noites, colocou ao seu lado a boneca pandora, sua única companheira desde sempre…também descolorida e desgastada pelo tempo, mas a boneca tinha olhos costurados e memória ruim, a boca era um risco e o nariz afundado pelo seu primo, ela nao parecia estar contente, nem a boneca, nem a garota, aquela. Foi quando ela respirou fundo, num desses momentos que só é possível respirar e isso já exige um esforço enorme e a pandora entendeu que devia permanecer quieta. Ela respirou, voltou ao quarto, viu que era tarde demais pra muita coisa e se decidiu em guardar os velhos óculos, descalçar os pés, desfazer as tranças, lavar os cabelos, despir-se da camisola acinzentada e nisso se foi quase a vida toda.

ana carla machado e fernando prado (via msn)